"Os últimos anos foram turbulentos, mas 2018 se coloca como um ano marcante na história do país, e não pelas melhores razões. Tentaram calar a boca de muita gente nesse país este ano. E muita gente gritou através do cinema. O CEN também gritou".
Os curadores e sócios da ACENDI, Jaqueline Beltrame e Ramiro Azevedo - foto Thiéle Elissa
Por Juliana Palma
O Cine Esquema Novo se propõe a expandir fronteiras e a derrubar as barreiras simbólicas e experienciais entre o cinema e as artes visuais. E nesta edição não foi diferente. O que foi diferente em 2018 foi o prazo mais longo entre a abertura das inscrições e seu fechamento, o que proporcionou um tempo maior de curadoria, para reflexão e pesquisa em cima dos filmes visualizados. O processo ainda contou com a participação de Vinícius Lopes como curador convidado, além dos sócios Jaqueline Beltrame e Ramiro Azevedo.
Vinícius Lopes, curador convidado da edição 2018 - foto Thiéle Elissa
"O Vinícius trouxe um olhar diferente que ajudou a chacoalhar os métodos e conceitos que invariavelmente criamos ao longo dos anos anteriores. Esse olhar de fora foi importante para revisitarmos nossa processo curatorial", explica Ramiro.
Vinícius completa: "foi a minha primeira vez na curadoria da competitiva do CEN. Ou seja, tudo novo. A nossa produção contemporânea é muito heterogênea, e nesse processo de curadoria eu assisti um grande número de trabalhos incríveis. Foi desafiador encontrar o que dialogava com a linha curatorial do CEN dentro dessa imensidão. Depois disso nos reunimos diversas vezes para debater e assistir aos trabalhos juntos. Foram meses nesse processo até chegar ao grupo de filmes da seleção final. Foi bastante intenso, mas a Jaqueline e o Ramiro foram muito generosos comigo durante todo esse processo".
No total, o Cine Esquema novo recebeu 875 inscrições - sendo 666 curtas e médias-metragens, 103 longas-metragens e 106 videoinstalações, videoperformances e performances de 24 Estados. Um panorama bem amplo do que nós brasileiros estamos produzindo no momento.
A curadoria do festival incluiu na mesma mostra competitiva obras de formatos diferentes. Afinal, "não é a competição que importa, mas coloca-las em pé de igualdade para o espectador", explica Jaqueline. "Na curadoria, sempre levamos em consideração os filmes que vão nos surpreender, que imaginamos que vão causar a mesma sensação nos espectadores. Com esse período mais longo de curadoria, além de analisarmos as obras inscritas, também tivemos tempo para ir atrás de outros filmes e convidar realizadores a participar".
No momento atual que o Brasil está vivendo, é praticamente impossível produzir arte sem entrar em questões políticas e sociais. E isso claramente acabou refletido tanto nos filmes inscritos quanto na seleção final para a Mostra Competitiva. Afinal, ficou difícil dissociar. E essa nem era a intenção.
"Os últimos anos foram turbulentos, mas 2018 se coloca como um ano marcante na história do país, e não pelas melhores razões, eu diria. Tentaram calar a boca de muita gente nesse país este ano. E muita gente gritou através do cinema. O CEN também gritou. Os filmes foram da pesquisa estética, passaram pela busca da identidade, revisitaram a história, libertaram a sexualidade e se posicionaram. O CEN também se posicionou com a sua seleção de filmes em 2018", afirma Vinícius.
Jaqueline completa: "Nós sabíamos que as questões sociais apareceriam na curadoria, só não imaginamos que seria tanto. Tanto é que pensamos em criar uma mostra política para reunir essas obras, mas não foi preciso, porque o assunto foi pauta na maioria dos filmes. Esta edição é bem específica porque é um momento de resistência e de permanência. Os filmes que exibimos têm a expectativa do que vai ser daqui pra frente".
Para Ramiro, o processo de curadoria sempre gera expectativa de ser surpreendido. E em 2018 ano não foi diferente: "tivemos belas obras que nos levaram a debates ricos e profundos sobre a produção audiovisual, sobre política, sobre inclusão e representatividade".